Pensei,
então, no porquê de tal título – Nossas Mulheres – com tratamento gramatical no pronome possessivo.
Subtendia, no caso, que as pessoas mulheres intituladas seriam objeto de posse, ou seja, pertenceriam aos três personagens homens?
Minha curiosidade acresceu mais ainda, quando ao chegar ao teatro e ler
o programa da peça, onde, ao informar sobre o espetáculo, lá estava escrito,
entre outras coisas, que a (comédia)
“ao contrário do que sugere o título, direciona o olhar do espectador para o
comportamento das três personagens masculinas” (aqui cabe um adendo: faltou
incluir no texto, o olhar “do Público” espectador, porquanto, no dia em que fui assistir, a plateia
era, predominantemente, mulheres e, a maioria delas, idosas).
Em outra página do programa havia um destaque sobre AMIZADE – ÉTICA e
FEMINICÍDIO denotando que “a peça trata desses três temas através do olhar e da
narrativa masculina” (...) “de 3 velhos amigos” (...) “devido a um crime
cometido por um deles”. O texto finaliza, dizendo esperar que, a peça “possa
contribuir para discussões sobre o comportamento masculino na sociedade
moderna, sobre o respeito às mulheres e sobre as liberdades individuais”.
Mas, aí, eu já estava cabreira com o uso do feminicídio expressado em
tom de comédia. Porém, não tinha ideia do que viria pela frente até ter assistido,
muito a contragosto, a peça e me questionando todo o tempo, se valia a pena
ficar até o final.
Resumindo, o texto em minha opinião é um escracho, do início ao fim. É
uma comédia de mau gosto que naturaliza no decorrer do enredo as várias formas
de violência física, moral e psicológica à mulher, mesmo diante do final
inesperado, que a meu ver, exalta o suposto assassino.
E, apesar de ter como intérpretes, três excelentes atores, experientes e talentosos, os quais, possuem o perfeito domínio
cênico no palco, além de, serem dotados de um ótimo timing na
encenação humorística, ao ponto de fazer a plateia rir às gargalhadas, de algo
tão sério, como é o Feminicídio, em tudo por tudo, deixa muito a desejar. Basta ver o modo
como o tema é tratado nesse espetáculo teatral. O texto é demasiadamente
agressivo e, totalmente, inapropriado. Principalmente, se levarmos em conta o
momento atual. Estamos vivenciando uma incidência enorme nos crimes de gênero, em que mulheres
são assassinadas, não só no nosso país, mas no mundo inteiro. O feminicídio –
tipo de violência que já está contida no
Código Penal brasileiro – é considerado crime hediondo, quando
se trata de assassinato praticado
contra as mulheres, motivado pela condição de
gênero e causado pelos sentimentos de desprezo, posse e ódio ao sexo feminino. E, também, quando
tal crime envolve menosprezo e discriminação à mulher, causa primordial da
violência doméstica e familiar. Esse crime, que tem atingindo proporções significativas da população feminina
em todo o mundo, continua a ceifar a
vida de tantas e tantas mulheres no Brasil. Tanto que, no ranking mundial de
mortes de mulheres, nosso país está na quinta maior posição no mundo, segundo
dados da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Logo, não entendo porque usar essa triste e nefanda ocorrência do
Feminicídio, para fazer comédia, nem mesmo que seja como dizem no programa da
peça, ser a melhor forma de “contribuir para a discussão sobre o comportamento
masculino na sociedade moderna”, (pelo que vi nada houve que levasse a essa contribuição), principalmente, no que se refere ao
relacionamento desses tipos de homens, com as companheiras na vida em comum e, muito menos, sobre o
“respeito às mulheres”. Para mim, o bate-papo que se dá entre
amigos durante a encenação, não passou de um exercício perverso de linguagem
misógina, o qual, só fez ratificar a superioridade da palavra do homem, sempre quando se trata de
hostilizar, menosprezar e depreciar a mulher que por na peça ser uma figura invisível, não tem nem vez, nem voz. E tenho dito aqui, minhas impressões de desagrado total.
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