segunda-feira, setembro 14, 2009

Nós Fomos as Cantoras do Rádio

Mulher: a musa inspiradora
No primeiro capítulo do livro que escrevi em 1992, editado pela Rosa dos Tempos e com distribuição exclusiva pela Record eu tratei da questão gênero na MPB ao abordar a ausência da voz da mulher nas letras que falam sobre ela própria.
Leiam mais abaixo o texto transcrito, quase que na íntegra, para depois dizer o que acham.
Qualquer comentário será de grande valia para mim porque estou em processo de pesquisa para o próximo livro onde pretendo continuar esse mesmo tema, só que, revisto, aumentado e atualizado.
Alguns trechos do primeiro capítulo do livro:
"A MUSA SEM MÁSCARA
Imagem da mulher na música popular brasileira"
Parafraseando o compositor popular, "há sempre uma imagem de mulher" a percorrer todo o universo da música popular brasileira. No entanto, até bem pouco tempo, ela aparecia apenas ocupando o papel de musa inspiradora, refletida pelo imaginário masculino que, por sua vez, influencia o imaginário coletivo.
Essa ênfase à "musa" deve-se a uma concepção machista da sociedade, que sempre estabeleceu a criatividade como um privilégio masculino. Para a mulher - em virtude de sua capacidade biológica de reprodução - reservou-se apenas a possibilidade de criar filhos. É com base nesse argumento falacioso, desprovido totalmente de comprovação científica, que os homens determinaram para si a exclusividade da autoria musical. (aqui cabe uma ressalva: essa prerrogativa não foi ou é exclusividade da criação musical). Sempre ocorreu em todas as potencialidades intelectuais da espécie humana, seja no campo das artes, das ciências, da política ou nos empreendimentos produtivos.
Ser cantora, até bem pouco tempo, era o máximo de concessão permitida às mulheres. A voz da mulher foi por muito tempo usada somente para reproduzir um discurso totalmente androcêntrico(masculino, por excelência) portador de uma ideologia sexista, racista, étnica e lesbofóbica. Nem de longe, as composições referentes à mulher vislumbravam qualquer possibilidade de relações igualitárias de gênero e raça. Ao ressaltar - de toda e qualquer maneira - a figura da mulher nas canções, não levavam em conta sua autonomia social. Também, nunca consideravam a possibilidade de desconstruir a narrativa musical hegemônica acerca das relações de gênero, contida indefinidamente nas letras da canção popular brasileira. Fosse qual fosse o momento histórico ou o contexto sócio-econômico-cultural os argumentos depreciativos à mulher, sempre foram uma constante, reiteirando preconceitos de toda ordem, ancorados em uma série de opressão e discriminação.
Compor era uma atividade implícita ao homem. Só ele era considerado mentalmente apto a desenvolver tal atividade artística. A disseminação dessa idéia generalizada que consolida a capacidade intelectual como natural ao homem, só fez contribuir para sustentar o mito da superioridade masculina. Dessa forma se estabelecia uma relação ventríloca entre o "criador (nesse caso o homem) e a "criatura"(mulher). A mulher cantora e musa, fica assim submetida a uma vontade que não é sua, apenas, como objeto e não SUJEITA de sua própria história.
CONTINUA DEPOIS